terça-feira, 18 de maio de 2021

Por que quero distância do universo geek atualmente


SPOILER: Este não é um post que vai tentar te convencer de alguma coisa. Não é um texto crítico, nem técnico, nem foto vai ter, tirando esta acima. É apenas a minha percepção dos últimos anos dentro do entretenimento. Chame de análise, se preferir, mas, honestamente, para mim tanto faz. Porém, talvez o melhor seja chamar o texto de “rançoso”. Provavelmente a primeira simbologia que esta palavra te traga seja sentimentos ruins, mas quero atentar que, primordialmente, chamo este texto de rançoso por hoje sentir o cheiro ruim daquela substância gordurosa e indigesta que existe dentro de todos nós. Espero que o cheiro ruim permaneça porque quero soltar algumas verdades particulares.

Então, saí um pouco da minha toca e resolvi escrever para manter os dedos exercitados. Comecei a fazer um conto dividido em 6 partes chamado Pacífico, onde eu contava sobre um herói que uniu o mundo com avanços tecnológicos e resoluções de questões políticas, mas desanimei afinal: quem se interessa, a longo prazo, sobre coisas importantes a não ser o escapismo?. Após, achei que seria uma boa fazer um texto sobre a duologia Batman de Tim Burton, mas parei também, com planos de retomar em algum momento. Então eu resolvi vir aqui e ofender o mundo nerd tal qual ofendi quando, em 2018, fiz um texto criticando os fanboys de Star Wars no extinto canal Família Marvel. Pois bem, hora de tentar repetir a dose mais uma vez.

A verdade é que eu já defendi este universo por acreditar que certas ondas que tomavam conta do público seriam passageiras. Não foram. Tudo piora e degringola e só precisamos de uma faísca para ver certas decadências aflorarem. Isto é permanente e só vai melhorar quando parte desta geração der lugar à próxima, com sorte. A vida já provou que gerações posteriores podem ser tão ruins ou piores, ou mais burras, que a anterior. Se você tiver algum fio de esperança sobre este assunto, poderei lhe dar pelo menos seis exemplos nos comentários. Assim crio em ti o Niilismo que há em mim, espero.

Então, acho de bom tom trazer à tona algumas questões incômodas a mim de maneira pessoal. Estou realmente pouco me importando se terei resistência ou se o texto vai aparecer entre os 10 mais lidos da semana. É fácil se vangloriar disso usando mainstream. É mais fácil ainda fazer isso tomando lados extremos. Ser preto ou branco facilitaria tudo, correto? Cria inimigos, mas ainda assim é mais adequado a criar simpatizantes. Vou me manter na área cinza, mas com apenas uma certeza: O mundo geek, tal qual como conhecemos, precisa acabar.

Mas chega de introdução. Verborragia demais afasta potenciais leitores e nem comecei a destrinchar meu nojo. Hora de pontuar algumas coisas e listar os meus 4 motivos.

 
Por que cansei do universo Geek?


HISTÓRIAS RUINS

Esta é uma questão muito particular. Com o passar dos anos comecei a ver Marvel e DC numa descendente crassa em qualitativo. As mesmas sagas quase sempre com personagens diferentes. Quer tornar alguém vilão? Chame o fulano e depois faça o mesmo com o cicrano. Quer matar alguém? Mate mas sabemos que ele volta. Vamos evoluir o personagem? Manda bala, mas depois precisamos que ele volte ao seu status quo original.

Não sou alta renda e não tenho dinheiro para comprar todos encadernados Image (TWD, Invencível que ninguém dava bola antes da animação, etc.) todos os meses e com o tempo, até mesmo a paciência estava diminuído. Obviamente, temos boas histórias. Acompanhei todo o possível de Imperdoável de Mark Waid, The Boys (antes de virar série) de Garth ennis, séries especiais da Marvel dos anos 70 e 80... Mas meu prazer sempre foi ler o material de gente que desenhava e criava as próprias aventuras. Mario Cau, Marcelo Campos, Salvador Sanz, Alan Moore, Mark Millar, Grant Morrison. O problema é que aqui no Brasil esse material é a conta gotas, quase secando da fonte. Quem aqui leu Menina infinito de Fabio Lyra? Ou já se prontificou a chorar com o final de Os Leões de Bagdá, de Brian K. Vaughan? Ou até mesmo buscou compreender o estado policianesco dos X-Men de Morrison? Fashion Beast, de Alan Moore, é uma HQ marcante, assim como Neonomicon. Estou falando de HQ’s mais antigas porque são as que li. Sei que teremos coisas muito boas atualmente. Mas me dei o direito de não querer mais e, no geral, não salva a péssima impressão que hoje tenho do segmento. Mesmo que sobre tempo para tal, me falta ânimo e acabo ficando com a sensação de que se contenta eternamente com pouco muito mais pelo peso do nome da editora ou personagem do que por algo realmente marcante. O que liga e me leva ao próximo tópico. 


GLAMORIZAÇÃO EXCESSIVA

Eu vou evitar usar o termo “No meu tempo era melhor”. Não há bons tempos quando se analisa de perto todos os períodos (a não ser o Pré-Neolítico). Mas eu vivi um tempo da vida onde tínhamos mais ceticismo, mesmo que empolgados com possibilidades. Todos sabíamos que os últimos filmes de Christopher Reeve como Superman eram uma droga, mas nos animamos com a possibilidade de haver um crossover com o Batman de Michael Keaton (que já havia ganhado público e crítica). Nenhum nerd era fã de Titanic, mas compreendíamos o potencial de um Homem-Aranha nas mãos de James Cameron. Obviamente nem tudo era agradável nisso, afinal, o conceito de Teia Orgânica veio dele, nos idos dos anos 80, (e posteriormente usado na trilogia de Raimi), mas no fim ela rendeu ideias legais. Miguel O’Hara não me deixa mentir.

Seja como for, vou ser um pouco mais específico: Num período pós-sucesso do MCU, o que vejo é a aclamação burra, muitas vezes. Há pouco, muito pouco, de dúvidas de um sucesso. Não há muitas críticas tecidas a Ultimato ou Guerra Infinita, que na minha opinião, expõe algumas limitações dos Russo. Ou até mesmo numa alegria boba quando o universo Marvel no cinema arranha um pouco mais de maturidade. Não se aceita a crítica e o contraponto morre dessa maneira. Olha-se uma catarse e a abraça de maneira cega.

Mas o que vejo é a empolgação imparável por algo que me soa tão... inútil. O senso que se vende é que precisamos daquilo. Virou o “gosto porque sim”. Aplaudimos apenas o texto que concorda conosco ante a visão do que o sucesso deve ser baseado em conceitos rasos. Apenas isso. Porém, isto é inofensivo, admito. Burro, limitado, mas inofensivo. Pueril? Digamos que sim. Talvez isso seja da idade. Quanto mais crescemos, mais compreendemos o mundo de maneira mais complexa. Exigimos mais da representação deles. Talvez eu esteja falando de maturidade, mas me refiro, ao menos em pensamento, no senso de amplitude. Não estou pensando em momento de vida, por mais que pareça que sim. Enigmático? Confuso? Deixe-me ser um pouco Tom Zé e confundir mais do que explicar apenas nesta linha.

Agora, lembram o que eu falei sobre o extremismo causar simpatia? Vamos ao outro lado desta moeda. Esta sim, perigosamente problemática. E igualmente estafante.


HATERS

Se por um lado temos a aclamação, do outro temos o ódio. Vejo gente “odiar”, sim o termo é este mesmo, tudo o que não agrada. Atores, diretores, roteiristas, estúdios, escolhas narrativas, orientação sexual de personagens, os intérpretes destes personagens, xenofobia e tudo mais o que se possa imaginar.

Falar de haters é um tema complexo. Eles vão tomar praticamente todo o último item abaixo e de início quero falar daquele que odeia o tempo todo algo tão supérfluo quanto ficção, e lamento informar isso a quem ainda não se deu conta que entretenimento é ficcional, e não se dá conta de como é limitado ser assim.

É possível encontrar toda uma gama de pessoas neste segmento específico e que sofrem com comentários extremos de pessoas que usam da internet para destilar ódio. Veja bem, não estou questionando a qualidade de certas produções ou escolhas criativas. Há material ruim para todo o lado, mas é de se perguntar porque existem tantas pessoas que empenham excessivamente a energia vital na contundência que só se agrava mesmo depois de anos do produto ser lançado. O meio-termo acabou, graças a pessoas assim, sendo visto pejorativamente como isenção, ou como chamam: Isentão. E por isso acabam invalidando a opinião alheia que se apresenta nessa vertente. Cria-se um universo paralelo, evidentemente separado do idólatra, de que não basta aquilo ser ruim, mas que precisa ser constantemente desconstruído e que afeta a sua existência e ai de sua alma se não se coloca a favor de seus ideais. Este é um meio de odiar produtos, o que acaba sendo revertido para odiar outras pessoas. Vou evitar dar exemplos para que não confundam opinião sobre uma metodologia de grupos com opinião sobre produtos, mas já tivemos exemplos disso em diversos lugares na internet, inclusive no próprio canal do FM ou nos extintos Floods do INC ou do Utopia Nerd.

E, infelizmente, essa necessidade de antagonizar com entretenimento não é caso isolado. Vejo cada vez mais adeptos a isso em muitos sites. E vou falar disso no próximo item.


NARRATIVAS POLÍTICAS NO MUNDO GEEK

Normalmente fujo deste tema por razões óbvias. Falar de política atualmente é sempre um caminho espinhoso e não vejo motivo para externar, ao menos eventualmente, o que penso sobre. Esta será uma dessas vezes e de maneira mais contundente.

Eu tenho problemas sérios com política atualmente. Não há quem me faça me sentir representado em sua totalidade e mesmo os quais eu coaduno parcialmente, são gritantes nas diferenças. Estou mais voltado ao tom apolítico do que conjecturas específicas do tema. Não consigo e nem quero aceitar de maneira cega qualquer um dos lados que o Brasil se dividiu nos últimos anos. Aceito algumas ideias interessantes da Direita, aceito outras ideias interessantes da Esquerda, mas qualquer tipo de Centro é, atualmente, corrupto. Então não estou em nenhum espectro desses. Quero mais é que todos os políticos e seus gados, com mortadela ou Whatsapp, se explodam abraçadinhos numa montanha de m**da. Acho que isso define tudo o que penso sobre o assunto atualmente. E vejam quanto o assunto é espinhoso e complexo: Estou no terceiro parágrafo e até agora sequer entrei na correlação do universo geek.

Antes de mais nada, vou deixar uma coisa clara: Vou pesar o assunto. Bastante. Então lembre-se de que esta é apenas MINHA opinião do porque EU cansei. Se você está feliz e contente como as coisas estão, fique tranquilo porque não fiz este texto pensando em você. Controle o dedinho nervoso.

Alguns anos atrás resolvi ler e estudar um pouco sobre alguns movimentos políticos que podem ou não terem sido regimes. Democracia, Parlamentarismo, Anarcocapitalismo, Anarquia, Teocracia, Capitalismo, Socialismo, Conservadorismo e por aí vai. E o que percebi é que criaram uma postura, nos últimos 10/12 anos, de enfrentamento no entretenimento. Não estou preocupado com quais são ou foram essas demandas porque, afinal, todos temos ideias de como algumas coisas podem melhorar diante das nossas próprias avaliações e experiências. O grande problema, para mim, foi como usou-se da conspiração para apontar melhorias e diminuição de segmentos. Ou seja, usaram e ainda usam de muita desonestidade sob a pecha de “opinião”. Veja se reconhece algumas das coisas que já foram ditas nos últimos anos:

Disney imperialista quer dominar o mundo

Quadrinhos como meio de inserção à valores americanos no Brasil

Quadrinhos como instrumentalização capitalista e machista.

Disney Conservadora

Streamings atendendo agendas globalistas

Lacração em mídias

Ideologia de Gênero sendo colocada para “nossas crianças”

Disney Progressista

Oito itens. Quatro itens para a Extrema-Esquerda, outras quatro para a Extrema-Direita. Notem como, no cerne, as críticas são as mesmas: Empresas usadas politicamente e proteção de valores em detrimento a outros valores apresentados. Percebam que ambas as vertentes políticas, diferentes entre si, usam os mesmos argumentos, apenas trocando o sinal. Foi aí que conheci a Teoria da Ferradura e aconselho que pesquisem sobre isso. É bem elucidativo, por mais que os idólatras achem que não. A Disney sempre foi taxada de conservadora e machista pejorativamente, mas foi só mudar a postura que se tornou lacradora e defensora de homossexuais. A Netflix era o símbolo da evolução da internet e como ver filmes, mas foi só adequar o material original para agradar um público maior e se tornou lacradora. Editoras da Marvel e a DC, editoras antes segmentadas ao nicho nerd, eram tachadas de machistas e sexistas, mas começou a atender algumas ideias e hoje sofrem na mão do mesmíssimo público que já a acusa de coisas bem ruins.

Anos atrás, mais ou menos em 2012, antes do Omelete trocar o sistema de comentários, que era próprio e depois foi colocado o Disqus, eu fiz mais ou menos a seguinte afirmação: “Nerd não está pronto para as mudanças. É só o filme dos Vingadores fazer sucesso que as pessoas exigirão que certas coisas mudem.” A ideia era clara: Novo público, novas ideias e exigências. Aumentar o escopo significa que, para continuar lucrativos, precisaria adequar-se à novos olhares para que estes se mantenham fieis.

Esse hábito de criar inimigos externos o tempo todo querendo demolir valores culturais e sociais se assemelha muito ao Fascismo, uma palavra que, assim como N*zismo, está bem promíscua e sendo utilizada de maneira irresponsável atualmente. Goste-se ou não, os dois lados Extremos já usaram de características para atacar os mesmos meios de produções culturais que seguem estatísticas quase que puramente financeiras. Ao incluir política em sua maneira de abordar algo tão simples como entretenimento, isto gera um bônus pontual como debates e algum amadurecimento na maneira de ver o mundo, mas gera muito mais ônus ao transformar a ficção numa politização que estica a corda até o limite. Já imaginou se os mesmos que hoje reclamam de personagens LGBT’s reclamassem também das discussões étnicas que X-Men buscou suscitar nos anos 60? As mudanças e as politizações acontecem desde as revistas pulps. É só ler O Aranha e O Sombra (os originais e não os quadrinhos) para verem como o americano retratava outras culturas e o cunho político que isso tinha em sua base. Ou ver como, após o início da derrocada das mesmas Pulps, heróis como Capitão América e Batman colocaram crianças para combater o mal para induzir o público infantil a consumir os produtos através da identificação. Zé Carioca, da Disney, hoje tão celebrado em nosso país, só foi criado nos anos 60 por um pedido do Governo Norte-Americano para que houvesse uma aproximação com países latinos e que nunca destruiu a cultura de ninguém.

Então, não vou poupar críticas. Esse lado fascista que todos assumiram com o passar dos tempos, em nome de um Q conspiratório e de agenda oculta que visava destruir a família ou sobrepor valores me dá sono, mas também é preocupante. Tanto a Esquerda e a Direita abraçaram esse “terraplanismo” imbecil. Exaltaram valores particularmente tradicionais em detrimento ao novo? Fizeram desde os anos 50. Desprezo pelos valores individuais? Fizeram. Mobilizaram as massas em nome de seus interesses? A internet se encarregou disso. Usaram de chauvinismo para massacrar diferenças com outros países, inclusive culturais? Com certeza. Eu poderia citar mais, já que os mesmos usuários de Disqus que fazem isso são os mesmos que cultuam líderes acima de tudo, quase a uma postura divina, outra característica fascista de quem isenta pessoas que ocupam cargos públicos de críticas. E digo isto apesar desta não ser a temática principal do post e eu não quero me aprofundar ainda mais nisso porque perceber como enfiaram a política em uma coisa tão escapista e de forma tão abjeta, me rende náuseas. É tanto preconceito, tanto problema por tão pouco, tanta raiva... Eu não quero mais conviver com isso. Sério. 

Isto posto, só queria mesmo mostrar porque tenho me afastado cada vez mais do mundo geek/nerd. Não que o mundo real seja mais interessante, mas é mais preocupante. Aqui as pessoas morrem de verdade e tem muito menos salvação. Alguém já imita Rorschach e diz “não” todos os dias para almas sofredoras. Por isso, prefiro, hoje, me concentrar em obras que reflitam o ser humano do que a grandeza jamais alcançada num universo inexistente com personagens cada vez mais idealizados e fictícios que falam cada vez menos comigo.

Te satisfaz? Ótimo. Mas a mim não mais. Tenho um carinho enorme por esses mesmos personagens e ótimas lembranças deles, todavia, hoje me resigno a acenar, virar as costas e desejar que um dia tanto suas qualidades quanto o público melhorem. Até lá, prossigo desanimado não apenas com meus próprios problemas, mas com um mundo que já me cercou assim como com aqueles dos quais já dividi preferências.

Atualmente e, provavelmente por muito tempo, meu pragmatismo se resume à: F**a-se.

Obrigado a quem leu até aqui este que, provavelmente, será meu último texto por um longuíssimo tempo.

Saitama de R’lyeh.

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