terça-feira, 19 de abril de 2022

Cinescópio #11: The Batman

TÍTULO: The Batman
ANO: 2021
DIREÇÃO: Matt Reeves
ROTEIRO: Matt Reeves e Peter Craig
TRILHA SONORA: Michael Giacchino
ELENCO: Robert Pattinson, Zoë Kravitz, Paul Dano, Collin Farrell, John Turturro, Jeffrey Wright, Andy Serkys.


Ok, conforme o prometido, finalmente The Batman. Nem vou perder muito tempo. Vamos para as considerações.

CRÍTICA

Antes de qualquer coisa, vamos ser honestos: The Batman é tecnicamente impecável. A câmera não é apressada e faz uso bem interessantes do plongée, os cortes são precisos, a trilha sonora molda muito bem a desesperança, mas admito que uma das músicas me lembra muito a introdução da música-tema de Darth Vader. Talvez até tenha sido proposital. Funciona nas primeiras vezes, mas depois de repetir-se, perde um pouco de impacto. Já a mixagem de som evoca perfeitamente uma sensação de novo misturado com coisas antigas, as interpretações, na maioria estão extremamente bem calibradas. A mistura de fotografia quente com fria em diversas cenas dá um tom bem mais imersivo. Se a Gotham de Reeves tem pouca personalidade quanto elemento, a fotografia auxilia muito na especificidade da imersão e do tom fúnebre do filme.

Sobre os atores, Collin Farrell está muito bem no papel de Oswald Cobblepot e nem preciso dizer quão irreconhecível está. Tem trejeitos próprios, a voz está bem convincente e tem presença. Jeffrey Wright finalmente mostrou o Gordon que eu queria há anos: Um homem cansado e com uma relação bem cinza com o Batman. Zoë Kravitz não foi a Selina Kyle que eu queria ter visto. Não achei que a atriz tem tanta presença, mas está ok. O Charada definitivamente entra naqueles casos de péssimo personagem adaptado, mas ótimo personagem de filme. Paul Dano, ator que conheço muito pouco, me impressionou com a potência vocal que possui e da presença mesmo com máscara. Sem máscara a visão do espectador mais atento muda e de ameaçador vai para ambiguamente comprometido. A loucura dele me soou muito mais algo próximo ao vilão Anarquia do Batman, mas ainda assim, faz bem ao filme e mexe com a trama de uma maneira ímpar. Seria melhor se fosse um Charada mais extravagante ou de ego inflado? Sim. Mas do jeito que está, convence como vilão. Eu gostei do Alfred de Andy Serkys mas poderia ter um pouco mais dele que não reclamaria. Vi algumas pessoas falando sobre ele ser um Alfred emocionalmente afastado do Bruce, mas o que vi foi um Bruce emocionalmente afastado, na verdade. E, pois bem, já que falamos do Batman, então vamos nos aprofundar nisso.

                         

É inegável que Robert Pattinson seja o Batman mais diferenciado até hoje dentro da franquia. Não acho que seja o melhor, mas o que melhor representa a realidade, isto sem dúvida. Se você já assistiu Nosferatu alguma vez na vida, deve ter reconhecido o andar seco e as expressões praticamente apáticas em boa parte dos seus diálogos. Tem um Q de Expressionismo Alemão, onde mais do que a escolha criativa de câmera e de ângulos pontualmente diferenciados, foca-se muito no tom desesperançoso do personagem-título (obviamente estou falando de Expressionismo Alemão de um jeito bem simplório aqui). É o Batman mais visualmente estranho que já vi e isto é agradável, sem dúvidas. Saíram algumas notícias no passado de que o Pattinson estava se recusando a ficar mais musculoso para o filme e isto o tornou um cara mais esguio do que bombado, ainda que definido e deu um tom a mais para o personagem. Aquela presença de Batman que a gente está acostumado não é tão forte. Ele não exala confiança e nem mesmo consegue soar intimidatório o tempo todo. E funciona em tela. A desconstrução do Batman é interessantíssima. Preciso ressaltar que o Bruce Wayne representado é bem mais simplificado do que eu esperava. Ele é melancólico, depressivo, suicida. Talvez por eu ter passado por essas três fases na vida, não o achei complexo ou impressionante. Perde-se valor por isso? Não. Continua sendo uma visão bem válida de Matt Reeves. Como citei acima, é diferenciado. Não é um estudo de personagem, nem desconstrução do que faz um Bruce Wayne ser Bruce Wayne, mas é um princípio de análise. Mesmo o revisionismo da sua relação com pai e mãe em determinado ponto do filme é resolvido rapidamente e sem maiores consequências. Porém, todavia, contudo, entretanto, não dá para negar que Reeves se arriscou. Não acho que se saiu 100% eficaz nisso, mas provavelmente foi a ponta do iceberg e isto, hoje em dia, quer dizer que veremos mais destes pontos em outras continuações. Então, tem efeito muito mais de entretenimento do que analítico.

Ok. Vamos para as partes menos legais da crítica.

Para um filme de 3 horas, temos um Batman que se esforça muito pouco para resolver charadas. Isso acaba exigindo que a trama se foque em situações variadas. Matt Reeves faz muito bem ao colocar alguns takes mais panorâmicos aqui e ali, algumas tensões entre policiais e Batman, e outras situações tampões como falsas complexidades e um terceiro ato que está lá porque precisa ter um ponto de virada que force o herói a ser mais herói do que um vingador. Não há um ponto que a gente sinta ser necessário para essa virada que citei. Reeves gosta de exibir o controle da própria grandiosidade. Isto é percebido em pelo menos um filme dele da trilogia do Planeta dos Macacos. Obviamente não é um fator 100% depreciativo e auxilia no espetáculo, mas fica bem claro depois de 150 minutos que ser visualmente impressionante não é sempre engrandecedor.

               

Aliás, outro pequeno problema de Matt Reeves é ser diretor exibido. Dentro disto, há muitos outros que o fazem também, não serei injusto. Eventualmente é funcional, até mesmo faz parte da mitologia do profissional. Mas como este filme já é longo, ao menos para mim, essa questão pesa. Se The Batman fosse um pouco mais enxuto, olhando mais para o essencial, com certeza eu teria apreciado certos exageros narrativos e visuais. Veja bem, eu não odiei o que vi, mas um pouco mais de direcionamento teria ajudado não apenas no cansaço, como na imersão. A título de curiosidade. Por mais que Liga da Justiça de Zack Snyder tenha uma hora a mais, a montagem é bem mais episódica e a variação de foco narrativo causa mais frescor. São três horas batendo no limite das mesmas teclas e alguns loopings, então sim, deu uma cansada porque há alguma estagnação.

Outra coisa importante é que nunca reclamei de falta de violência em filmes. Era plenamente possível um Batman com ainda menos sangue do que este teve se a proposta fosse outra, mas 10% a mais de grafia teria dado mais peso a alguns momentos. Apenas o suficiente para que os acontecimentos tivessem mais crueza e congregassem mais diretamente à sensação da falta de mudança que o protagonista tem diante de Gotham.  Porém, dentro da faixa etária indicada, Reeves faz um bom uso da tecnicidade já citada no início da crítica para incomodar o espectador.

Eu já comentei para vocês algumas vezes e de maneira sutil, sobre como algumas vertentes da arte têm se direcionado cada vez mais para personagens mentalmente, fisicamente e moralmente enfraquecidos nos últimos 20 anos. Creio que falei a 1ª vez sobre o assunto em 2018, na época dos textos literários. Do que já li e vi, esse movimento já existente se intensificou no Pós-11 de Setembro e ao ver The Batman, senti muito isto. Há vulnerabilidade, tragédias, ampliação de realidade em detrimento da fantasia e uma certa soberba dos próprios defeitos e como eles somam à trama. Dentro deste escopo, há a simbologia geral do que é Gotham. Não consegui me sentir conectado com a cidade como na Trilogia Nolan ou abraçar sua iconoclastia excentricamente visual da Duologia Burton, mas há presença e isto é fato.

                              

As referências que existem aqui e ali são protocolares. Não vou me ater a elas para evitar spoilers, mas pelo menos duas dão algum vislumbre do futuro. Destas apenas uma faz parte da trama de forma direta e tem papel decisivo no Clímax, mas como vem para a tela, vai embora infelizmente.

Isto posto, The Batman é um filme visualmente épico e de trama que tenta se mostrar intrincada. Consegue ser inquietante, tem potencial e funciona como ponta pé inicial de uma franquia. É muito bom ver as pessoas se dando conta de um crescimento cênico de Robert Pattinson agora, mesmo isto já ocorrendo há alguns anos. Tem um roteiro que precisaria ser um pouco mais enxugado, personagens que poderiam ter um pouco mais tempo de tela e uma história com mais gordura do que precisa. Ainda assim, é um grande Batman e um Bruce em construção. É um filme que se faz pelas próprias qualidades, mas definitivo como dizem por aí, não.


NOTA: 7,7


Então é isso. Espero que tenham gostado.

Abraços, Saitama. 

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