Elenco: Dwayne Johnson, Aidis Hodge, Sarah Shahi, Pierce
Brosnan, Quintessa Swindell, Noah Centineo, Bodhi Sabongui, Mohammed Amer, Marwan
Kenzari, Viola Davis, Henry Cavill
Diretor: Jaume Collet-Serra
Fotografia: Lawrence Sher
Roteiro: Adam Sztykiel
Onde Assistir: HBO Max, Amazon Prime
Antes de qualquer coisa, peço desculpas pela demora da crítica. Eu simplesmente
apaguei o filme do meu computador e não tinha percebido. Enfim, problema
resolvido e vamos lá. Sei que tem muita gente com ideias já concebidas sobre o assunto em questão, mas gostaria de dar alguns dedos de prosa a mais nessa eterna discussão
que virou The Rock e sua visão de Adão Negro. Importante dizer que não vou
falar sobre as polêmicas posteriores que envolveram o ator em relação ao
longa-metragem. O que nos interessa é o filme e tão somente o filme.
Inevitavelmente, à sinopse: Depois de passar 5 mil anos aprisionado após salvar seu país da
tirania, Teth-Adam sai de seu cativeiro para reencontrar uma Kahndaq refém mais
uma vez de mãos poderosas. Cabe a ele ser o libertador mais uma vez (ou não),
enquanto enfrenta Sabbac, Sociedade da Justiça, Amanda Waller, a Intergangue...
CRÍTICA
Uma das vantagens em ser desinteressado no universo de heróis cinematográficos
é não poder ver um filme meses depois e ser pego de surpresa com N coisas. Eu
sabia que tinha o Cavill nas cenas pós-créditos e sabia que o Pierce Brosnan
estava no filme como Sr. Destino. De resto, sequer lembrava que o Ex-He-Man
estava no papel do Esmaga-Átomo.
Apesar disso, creio que a maioria aqui lembra-se de quanto fui crítico à
apropriação que The Rock se deu o direito de cometer com Adão Negro a cada
notícia de bastidor. Era um prenúncio de que algo execrável se aproximava e...
... não achei o filme imprestável.
Antes de qualquer coisa, é importante dizer que o diretor Jaume Collet-Serra luta com
todas as suas forças para tornar The Rock não apenas o centro comercial do
filme, mas o protagonista moral de um senso inevitável de que Adão Negro seria
um passo à renovação. Isto é evidente quando sentimos a expansão do DCEU ao
longo do desenvolvimento narrativo do filme. Tudo é milimetricamente feito para
que exista algo a ser contado após o fim do filme, como toda franquia de
heróis. Há uma primária e desavergonhada órbita em torno do Adão Negro em sua
importância não apenas para o filme, mas para toda a pretensa nova fase,
obviamente, cunhada pela imagem de The Rock. Esta imagem é força motriz do
ator, que funciona a base de engajamento virtual e de uma absurda romantização
de suas atuações limitadas. Não por menos li diversas vezes o argumento “ah,
mas ele é carismático” como qualitativo quase único para o que se apresenta em
tela. E aqui isto é elevado à enésima potência, ainda que o filme lute para iludir o espectador desta sensação.
Mesmo que The Rock leve pouco mais de 15 minutos para aparecer no filme, essa
centralização tem um custo: Narrativamente falando, sua priorização afeta a
qualidade dos que não o envolvem, seja de outros núcleos ou de suas correlações
intrapessoais. Que dirá Adrianna, Amon e Karim onde há pouco apuro técnico, com
atuação medíocres, enquanto sofrem com linhas de diálogos ruins. Suas
interações beiram ao risível, são pobres, com piadas ruins e fora de hora (algo
que foi emulado da Marvel). E mais um custo: Isto tudo coopera para que não
haja identificação com o espectador. É impossível se importar menos com a
história destes três personagens. Jaume Collet-Serra sabe que eles estão lá
apenas para dar sustentação compulsória à misantropia à lá carte de Adão Negro
e faz questão de comprovar isso para aqueles que assistem seu trabalho. Outro
que sofre com essa falta de apuro é Ishmael e vale um pouco mais de atenção na
análise. Marwan Kenzari é capado em tempo de tela, sem desenvolvimento
adequado, acaba sendo jogado para dar as falar e as informações apenas para que
o espectador tenha o mínimo para não se perder na história. Não é apenas porque
o filme em si é poluído de tentativas de derivados futuros apresentando
personagens e dando a todos eles algum tipo de espaço, mas também porque ele
opta pela simplicidade para outros temas que precisariam de maior profundidade.
Um exemplo é boa ideia de falar sobre a seletividade intervencionista e internacional com países
em situação de risco. O conceito é ótimo. Onde estava a Liga ou a SJA para
libertar Kahndaq de seus opressores antes de Teth-Adam ser liberto? Por que
esses seres aparecem apenas para lidar com os fantasiosos problemas de suas
fantasiosas existências? Heróis, em resumo, não feitos para ter lados reais,
pois isso daria para eles responsabilidades e possibilidade de errar. O herói,
acima de tudo, é irreal. “Realidade demais para uma sexta-feira”, como se diz
em um diálogo de Melhor É impossível. Adão Negro se preocupa em abordar o
difícil tema citado acima, mas não aplica a pessimista resposta além da
primeira camada que se perde na centralização de The Rock, o que deixa tudo
resoluto em conversas rasas e problemas irreais. Percebam como todos os
problemas se conectam e se retroalimentam para o engrandecimento da figura de
Teth-Adam/The Rock como agente transformador tanto dentro como fora do filme. Ainda
que se tenha críticas a filmes como Batman vs. Superman, lá havia respostas
mais complexas, discutíveis, claras e menos otimistas - mais opinativas - para temas semelhantes em como o Übermensch
afeta a sociedade real. Esse tom redundante de Adão Negro, que consiste em
recauchutar microconceitos em meio à clichês, o faz perder força como objeto
discursivo, ainda que ganhe força no entretenimento fácil. É uma escolha covarde.
Porém, no aspecto divertimento, o filme funciona. Para quem se contenta com frivolidades (o que
não é pecado, diga-se de passagem), Adão Negro é uma boa pedida porque ele se
vende assim na sua execução e por vezes até satisfaz desta mesma forma. Poderia
ser mais? Poderia. Deveria ser mais? Aí já cabe a discussão. Eu mesmo me peguei
achando ótimo outro tema ser abordado após o discurso pouco inspirado de
Adrianna sobre a “super-heroica” interferência estadunidense em Kahndaq. Já que
estou no tema de externalidades que se apropriam do país africano, gostaria de
citar a confusão irrelevante que é a Interngangue. Nunca fica claro o que eles
são e as inferências sofrem para chegar à algum tipo de dedução, que nunca são satisfatória. Ora parece ser um conglomerado terrorista, ora parece ser
um grupo paramilitar ou até mesmo militar americano. Fica evidente que a
organização serve muito mais para ter soldados para apanhar de Teth-Adam e apresentar
um igualmente confuso e raso Ishmael do que para se estabelecer como ameaça
real.
Outro ponto a citar é o evidente tom hereditário do filme. Os filhos pagam pelos pecados dos pais. Adrianna vê seu filho sofrer pelas suas escolhas, Adam vê o seu morrer pelas escolhas feitas que resultam em sacrifício. O senso de vínculo entre ele e a jornalista poderia ter sido melhor trabalhado se não houvesse tanta preocupação em criar um plot twist que teria sido melhor executado como desenvolvimento. Ainda assim, é bonito ver como ambos os casos se conectam, ainda que falte capacidade interpretativa para Dwayne Johnson.
Outro ponto a citar é o evidente tom hereditário do filme. Os filhos pagam pelos pecados dos pais. Adrianna vê seu filho sofrer pelas suas escolhas, Adam vê o seu morrer pelas escolhas feitas que resultam em sacrifício. O senso de vínculo entre ele e a jornalista poderia ter sido melhor trabalhado se não houvesse tanta preocupação em criar um plot twist que teria sido melhor executado como desenvolvimento. Ainda assim, é bonito ver como ambos os casos se conectam, ainda que falte capacidade interpretativa para Dwayne Johnson.
Aliás, esse excesso de “as coisas não são o que parecem” me deixou cansado
justamente porque isso já estava meio óbvio desde suas aparições iniciais. Era
óbvio que a as visões do Sr. Destino seriam relativizadas. Era óbvio que Teth-Adam
não era o salvador de Kahndaq (aliás, plotzinho sem-vergonha que me lembrou
bastante O Samaritano). Era óbvio que a pancadaria entre SJA e Adão Negro só
serviria para uma aliança posterior. Tudo isso, como disse mais acima, serviu
para colocar a imagem do The Rock no centro moral e narrativo do longa de uma
forma pouco ou quase nada orgânica. Era o The Rock, o que mais o fã deveria
esperar diante deste fato que não uma pessoa que toma conta dos holofotes e se esquece dos dramas e dos roteiros?
Sobre os efeitos especiais, há pelo menos três momentos que o plano de fundo distorce (aparentemente
feitos naquelas telas grandes usadas para fundo), deixando pessoas e árvores
repuxadas e mais magras/altas que o normal. De resto, achei os efeitos em si bem feitos, aliás, muito bem feitos. As cenas de luta são
empolgantes, com exceção de um momento ou outro. Aidis Hodge, Pierce Brosnan,
Noah Centineo e Quintessa Swindell estão muito bem em seus papeis. A boa
química entre os atores ajudou bastante a deixar tudo bem interessante, o que
me faz lamentar que tenham grandes chances de serem esquecidos nessa nova fase
Gunn. São atores que deram peso e conteúdo aos seus personagens inclusive nas
batalhas. Queria muito ver qual das encarnações de Cartel Hall conhecemos em
tela e, porque não, vê-la melhor trabalhada.
Partindo para tecnicalidades, gostei de alguns enquadramentos de Jaume
Collet-Serra. Alguns contra-plongée's e plongée's, poucos planos americanos, porém
os excessos de close-ups me incomodaram um pouco. Toda vez que um diretor usa
demais o mesmo artifício em um filme que exige, ou permite, muitas variações,
percebo ou uma falta de técnica, ou exigência de estúdio/ator, ou algum tipo de
mascaramento de problemas. Já a referência incluindo um paralelo entre um filme
com Clint Eastwood me pareceu homenagem fora de lugar. Outro ponto que não me
agradou foi algumas trilhas do EUA num filme que ocorre em outro país, com forte
cultura própria. Isso faz elo com o outro ponto citado acima: Como os
habitantes de Kahndaq rechaçam tanto os estadunidenses, mas absorvem sem pensar
duas vezes sua música? Não me parece lógico, ao menos, não aponta ter
explicação plausível. Saindo do negativismo, há também muitos takes feitos para
screenshots e pôsters. Tem pelo menos quatro momentos assim que o filme se
dispõe a ser esteticamente belo, enchendo os olhos e renovando minha fadiga de
duas horas de The Rock. Ainda falando do visual e tom, o filme se dá o direito
de ser óbvio demais. Os apontamentos visuais, seja escondendo o rosto do pai de
Hurut, seja deixando o uniforme de Teth-Adam escuro até o terceiro ato e
mostrando o enobrecimento moral logo depois, tornando-o brilhante. É pobre, honestamente
acho até um pouco desdenhoso com o espectador, mas é isso aí que o gênero se
tornou há anos: Simplista e reduzido. Outro ponto para se destacar de maneira
curiosa é o trabalho de Lawrence Sher em imitar os tons dessaturados e em
outros momentos ele emula as mesmas explosões de cores do antigo idealizador do
DCEU, inclusive em câmeras lentas (numa cena de batalha muito boa no início).
Tivessem me dito que o filme era do Snyder, entre os erros e acertos, eu teria acreditado.
Gostaria de dedicar também todo um parágrafo para Viola Davis. Mesmo
nitidamente enjoada do papel, prossegue sendo uma atriz de primeiro escalão. A
seriedade, a postura, aquela fúria contida de super-seres que mereceriam a cela
muito mais do que trabalhos para o governo... continua tudo lá. Viola é uma atriz
de mão cheia, provavelmente muito ciente de todos os imbróglios que o estúdio se
meteu com o DCEU e não precisa (e talvez nem queira) mais estar lá. É o único caso que acho
maravilhoso que seja descartada porque a considero grande demais para um papel
tão pouco recompensador. O mesmo penso de Henry Cavill. Apesar de achá-lo um dos melhores Supermen que já tivemos, ele merece mais como ator, inclusive ser desafiado na sua profissão.
Isto posto, Adão Negro não é tão ruim quanto eu achava, porém falta desapego, coragem,
coração e uma boa dose de noção de si mesmo. Este é um típico caso de filme que não chega a ser desonesto, mas é autoindulgente e que se justifica com uma boa dose de “filme de herói é assim”. Aqui
temos um longa-metragem de conceitos embrionários, com poucos desenvolvimentos
que importam de verdade, mas que ainda assim satisfazem por saberem bem mascarar
a realidade com a fantasia. Tivesse sido feito há dez anos atrás, teríamos um clássico do gênero, mas ele se tornou anacrônico. A Cultura de Massa nunca esteve numa fase com tão pouco a
dizer enquanto teve tanto a mostrar. E ainda que este caso seja um de seus
tropeços, segue mais viva do que nunca. Infelizmente, tudo mais é Vaudeville.
NOTA: 5,3
Espero que tenham gostado. Bons filmes e até a próxima.
Abraços.
Saitama de R’lyeh.
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