sábado, 2 de dezembro de 2023

KISS - ACABOU?

Hoje, dia 2 de dezembro de 2023, às 22hrs (horário de Brasília), Kiss subirá pela última vez aos palcos nos seus mais de 50 anos de carreira, apresentará seus maiores hits e se despedirá de seus fãs. Gente como eu, que os escuta quase que diariamente, atualmente muito mais por causa do meu filho mais velho, a qual repassei a paixão pelas músicas eternizadas por Paul Stanley e Gene Simmons, os únicos remanescentes originais da banda, juntamente com Tommy Thayer e Eric Singer.

Então resolvi sair do fascínio pueril que a banda me causa e escrever algumas palavras (duras) de despedida. Não há jeito melhor de dizer tchau a quem lhe acompanha por quase 30 anos com uma bela contenda, claro, desde que essa realmente seja a última turnê, já que todo fã da banda já viu essa ladainha antes. Mas sim, acredito que desta vez realmente seja o adeus. Paul e Gene já não conseguem se manter como antes na banda, afinal, respectivamente, com 71 e 74 anos, simplesmente é humanamente impossível fazerem o que fazem sem ter o corpo absolutamente esgotado.

E a simples verdade é esta: Nos últimos anos tenho visto um lado podre da banda que tem me deixado cansado. Brigas públicas entre Paul/Gene com o ex-integrante Ace Frehley, falas transfóbicas, playbacks em shows... tudo tem me direcionado para olhar a banda com um olhar clinicamente ácido. A empresa KISS é diferente da banda KISS e, mesmo assim, tudo se confunde. Público e privado se misturam às mágoas entre membros, relações desgastadas, autobiografias ofensivas e... dinheiro! Sim, Kiss briga por grana, apesar de terem grana para as próximas duas gerações apenas em merchandising. Paul e Gene, por terem seguido com a banda mesmo com as saídas de Ace e Peter, tem todo o direito de lucrar a mais, afinal, foram eles que estiveram como frontmen, nos erros e nos acertos. O grande problema é terem tratado todos os outros membros posteriores como empregados, deixando sempre muito claro que o tom era de substituição, ainda que tivéssemos formações muito mais técnicas e apuradas do que a formação Paul/Gene/Ace/Peter. Isso nos leva às brigas por direitos autorais, direitos de imagem e pedidos de aumento nas coparticipações (o que é justo). É difícil acreditar que uma banda de ganhos tão exorbitantes e regulares tenha tanta dificuldade em trazer uma equipe de advogados capazes de contornar as tretas de se tornarem públicas. Ninguém ganha o mundo com as pernas fechadas no showbusiness, mas parece que o Kiss ainda insiste nessa lógica, que funciona.

Peter, Gene, Paul e Ace. Formação original, anos 70

Mesmo ouvir suas músicas têm um peso diferente hoje em dia, talvez pelo excesso de vezes a qual fiz isso. Perdi a conta de conta de quantas vezes toquei seus inúmeros trabalhos. Destrinchei cada disco dos anos 80, conheci cada acorde do que foi produzido nos anos 90, incluindo aquelas músicas que nos venderam uma coisa, mas foi produzida de outro. Sofri ao analisar seus últimos trabalhos em estúdio. Sonic Boom (2009) e Monster (2012) são duas pequenas atrocidades com raríssimos acertos. Mesmo que tenhamos álbuns que são celebrados até hoje como Dinasty (1979), Hotter Then Hell (1974), Hot In The Shade (1989), Creatures Of The Night (1982) e seus conhecidos quatro discos ao vivo conhecidos como Alive! (1975, 1977, 1993 e 2003), dentre outros, hoje há muito pouco que me impressiona na banda. Vi a vivacidade dar lugar à uma tentativa atrás da outra em busca da eterna relevância. Revenge (1992), por exemplo, foi o ápice desse desespero. Uma mistura demente de sucesso esquizofrênico, ou vulgarmente conhecido como “se colar, colou”. Um disco tão sem identidade que agrada mais pelos fragmentos apresentados do que pelo todo desenvolvido. E é raramente citado pelos fãs pelo conjunto da obra. O máximo que se faz entre as extintas rodinhas de amigos (bem punheiteiros, por sinal) que ouviam isso era falar sobre o duplo sentido da música “I Just Wanna” com a mesma maturidade de quinta série que faziam mulheres maduras mostrarem os seios em seus shows. Em tempo: I Justa Wanna contém o refrão “I don’t wanna romance, I don´t wanna dance. I just wanna forget you”. O “forget”, pronunciado rapidamente soa como “fuck”. Aí vocês já têm uma noção de como essa canção fazia a alegria da molecada. Os anos 80 e 90 do KISS foram tomados pelo hedonismo insuportável personificado por Gene Simmons nos bastidores por anos. Não tinha graça na época, continua não tendo graça hoje. Mas eles reforçaram esse estereótipo de f*dedores em público até onde puderam, quase sem charme e com uma dose de baixaria pontual. Nunca vou me esquecer quando colocaram uma menina de menos de 14 anos cantando “Let’s Put The X in Sex”. Trocadilho para “vamos coloca os pingos nos is”. Aliás, faz mais de vinte anos que é bizarro ver eles cantando música de desejo por uma menina de dezesseis anos. “Christine Sixteen” segue um bom exemplo que a hora de parar nunca foi mais urgente. As duas únicas músicas deste período “p*u  durasso” da banda que considero qualitativa é “Lick It up” e “Uh! All Night” com bons arranjos e um pouco mais de carisma, funcionam até pelo elemento de humor que carregam na safadeza das letras.

Olhando em retrospecto, é estranho admitir que a maior parte de seus discos apartir dos anos 80 foram produzidos mais como uma renovação de fãs, muitas vezes que passavam a paixão de geração em geração (como meu caso) e levavam seus filhos para os shows do que a busca de um público fora da bolha. Isto se prova no DVD KISS – Rock The Nation, onde a bizarra fala de um Paul Stanley cinquentão diz “Estivemos aqui pelos seus pais e estaremos aqui por vocês [os filhos]! O KISS estará aqui por vocês também!”. Ainda assim, se não acreditar em mim, sugiro um desafio para vocês: Façam uma rápida pesquisa com seus amigos OFF e perguntem quantos deles começaram a gostar de KISS nos últimos anos e quantos já gostavam antes. A resposta não vai te surpreender. KISS é uma banda acomodada? Sim. Muito do que foi produzido também serviu para introduzir os fãs aos produtos da banda, que são infindáveis. Desde os mais comuns como bonecos, camisetas, máscaras, bandanas, até os mais excêntricos como camisinha e caixões. Sim. Você pode ser enterrado com o rosto do Paul Stanley consolando seus familiares ou tentar orgulhar Gene Simmons na cama. Tem até uma língua inflável de quase 13cm do baixista, com aplicações duvidosas que é, ou era, vendida na gringa. As possibilidades são infinitas para quem quer se sujeitar a isso.


Então vamos lá, sendo friamente calculista aqui: Qual o último trabalho da banda que realmente foi relevante sem depender de marketing out music? Alguns divergem aqui. Enquanto parte dos fãs apontam para o POLÊMICO disco Psycho Circus (1998), a crítica atual ainda olha para Dinasty (1979) como um divisor de águas para os rumos criativos do KISS. Já vi gente celebrando Hot In The Shade (1979), mas é um disco renegado pela própria banda, então, o desconsidero. Na minha humilde opinião, o último disco realmente relevante da banda foi o MTV Unplugged (1996), a última grande porta de entrada para novos fãs. Com uma pegada country, quase pop-folk em alguns momentos, reapresentou a banda para um público pouco interessado em p*taria em suas músicas e focou mais no lado descontraído, com letras rasas, porém de arranjos bem trabalhados e até mesmo um pouco de autoparódia. God Of Thunder num estilo texano serve de exemplo. Ainda assim, eles souberam falar sério quando necessário durante o especial. Every Time I Look At You, Comin’ home e as músicas que reuniram Peter Criss e Ace Frehley são pequenas pílulas de sabedoria entre nós, pobres mortais. Fora que, se não me engano, foi o único acústico que teve duas batarias tocando simultaneamente.

E só. Kiss, depois disso, foi apenas um amontoado de busca incessante de aproveitar o retorno de seus dois integrantes originais, superestimação da figura mítica das suas maquiagens, turnês exaustivas, brigas internas, novas trocas de solistas e bateristas, e o resto foi o já citado jogo para torcida. Kiss sempre teve uma camiseta de peso grande, mesmo que seja mais o nome do que outra coisa. Sei que, vindo de um fã, são palavras amargas, mas acho justo dizer que ser fã não é apenas celebrar. Sem olhar crítico, nada vai pra frente. Ugh, Th... quer dizer... Ugh, Paul!

Se hoje me renovo com a banda, é por causa do Giuseppe, meu filho mais velho. É ele quem nutre uma paixão pueril pela banda, a ponto de dizer que Paul Stanley é o melhor canto do mundo. A ponto de ainda se impressionar com o sangue falso que escorre por Gene Simmons nos shows e olhar para Tommy Thayer e Eric Singer e gostar mesmo é de Ace Frehley e Peter Criss em seus intermináveis solos disponíveis pela internet. Não sou mais o fã que era há mais de 25 anos atrás, mas ainda nutro um pouco de olhar amoroso pela banda, admito. Seus discos solos são incríveis, seu primeiro e segundo “Alive!” ainda mexem comigo e acompanho com certa atenção todos os trabalhos de Ace Frehley, mesmo os mais dispensáveis. Sei que parece um pouco contraditório depois de todas as críticas, mas não é injusto dizer que KISS foi a banda que me apresentou o rock divertido, o rock das maquiagens. Foram eles que me fizeram me apaixonar por tocar baixo. Foram com eles que me apaixonei a primeira vez ao som de Forever e foram com eles que me despedi ao som de Beth. Certo, acabei de dar uma embargada aqui. Vamos para o final do texto.

Isto posto, Kiss pode não ser mais o que foi. Pode até nunca ter sido aquilo que os fãs acham, mas ainda assim, mesmo com polêmicas e fracassos (todavia, sempre muito ricos), sim, é minha banda predileta. Amo odiá-los, mas sentirei falta. Essa falta nunca será forte demais, afinal, em tempos de internet, sempre temos o acervo todo de qualquer um a um clic de distância. Mas ainda assim, mesmo com toda a minha fúria de ver o que todos se tornaram, segue as seguintes palavras: Obrigado Ace Frehley, Peter Criss, Paul Stanley, Gene Simmons, Eric Carr, Eric Singer, Vinnie Vincent (te odeio, mas te amo), Tommy Thayer, Bruce Kulick, Mark St. John, Phil Ashley, Rick Derringer, Holly Knight, Adam Mitchell, Anton Fig, Robben Ford, Allan Schwartzberg, Jimmy Haslip, Tom Harper, Shelly Berg, Mike Porcaro, Bob Kulick, Kevin Valentine, Derek Sherinian, Steve Farris, Jean Beauvoir e Dick Wagner. Dos músicos “oficiais” aos músicos fantasmas, todos foram importantes, à sua medida, de fazer o KISS ter sido o que foi.

A essa importante banda do rock estadunidense e mundial, que tanto embalou milhões de pessoas, meu último desejo sincero e honesto: O último que sair, que apague a luz.

Espero que tenham gostado. Este não é um post que vai gerar muito engajamento, mas ainda assim, queria deixar registrado parte do que sinto aqui.

Boas músicas, 
Saitama. 

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