sexta-feira, 21 de junho de 2024

SEIS FILMES MISANTROPOS (da minha vida) QUE VOCÊ PRECISA CONHECER


Misantropia é a aversão, repulsa, o ódio ou desprezo pela condição humana e sua natureza. Com o passar dos anos, muitos estudaram suas implicações e é óbvio que isso encontraria uma vertente no cinema. Por isso, decidi descer da montanha e trazer seis longametragens que me tocam muito no tema e que você pode (e deveria) (re) assistir em algum momento de sua vida. 


ATAQUE DOS CÃES - 2021 

Eis um filme que você não esperava ver aqui. Em sua base, é uma história sobre a sexualidade, amores e seus impulsos no mundo cru, injusto e ingrato do Velho Oeste, onde todos fazem o possível para sobreviver. Porém se sairmos do tom mais óbvio (se é que Ataque Dos Cães tem algum ponto óbvio), vemos a completa alienação àquilo que seu universo apresentado representa. Ainda que Rose (Kirsten Dunst) seja um fio de esperança, é rapidamente sucumbida pelo ecossistema criado pelos personagens masculinos, afinal, o mundo do Faroeste foi ditado pelo homem. Analisado isto, tanto Peter Gordon e Phil Burbank (magistralmente interpretados por, respectivamente, Kodi Smit-McPhee e Benedict Cumberbatch) representam faces da mesma moeda do rancor, mas com uma única moral: A repressão sexual fere e nos faz reagir de maneira odiosa. O final é magistral e pesado, mas não menos importante do que todo o caminho duramente pavimentado até ele. 

MELANCHOLIA - 2011

Já falei desse filme em outros momentos, mas é importante citar toda a misantropia no longa de Lars Von Trier. Considero-o uma carta de desistência de si mesmo, ainda que numa metáfora coletiva sobre morte. O final do filme, conforme sempre digo, é entregue desde o 1º ato, durante o Réquiem inicial. A partir daí, você acompanha a relação entre duas irmãs e os contrapontos discorridos na trama entre a depressão e a negação. Não é um fácil de fácil digestão, ainda mais quando olhamos os diálogos que evidenciam o alívio de Justine (Kirsten Dunst no que considero sua melhor atuação até hoje) com o possível fim do mundo e de como toda a história humana, tudo o que conquistamos, o que aprendemos, cada filho, cada pai, cada mãe, no fim não adianta de nada diante da aniquilação total. Mais misantropo, impossível. 

ENTREVISTA COM O VAMPIRO - 1994


Completando trinta anos agora em 2024, Entrevista Com o Vampiro segue um clássico do desdém e do detrimento ao que é humano. A tríade Lestat, Louis e Claudia (Kirsten Dunst está aqui de novo e juro que é totalmente involuntário), cada um à sua maneira e nível, encarnam a negação ao humano. É um filme, daquele tipo bem raro, que te permite um certo regozijo nesse tipo de sentimento. Incomoda mais a medida que a violência gráfica ocorre, mas te envaidece com a música clássica ou dos diálogos requintados. É um filme fácil de te fazer ter um lado. Mesmo Lestat, com seu ar afetado mesclado com o autoritarismo, causa paixão e leve essa palavra como quiser. São personagens sedutores no sentido amplo da palavra, ao mesmo tempo que te fazem experimentar esse ranço ao "normal". E não por menos, há ótimos paralelos também com o niilismo como problema social (saindo do contexto cultural apresentado por Nietzsche e a decadência cristã) e apresenta a ideia do Eu-Associal, onde aponta para os vampiros serem o que são em suas construções morais mais ocultas, independente dos pesos morais de uma sociedade que diz muito pouco respeito a eles. Enfim, é um filme que, diferente de Melancholia e Ataque Dos Cães que se validam de finitude, Entrevista Com o Vampiro busca, em seu final, um grau de esperança, mas sempre valorizando o pós-humano. 

DISTRITO 9 - 2009

Vamos falar do filme queridinho da galera e que de repente todo mundo quer uma continuação? Vamos. Pois bem, que petardo! Efeitos especiais incríveis, trama completamente baseada na tragédia de duas raças e no senso de superioridade humana. Mostra, numa alusão muito pertinente, como é triste quando dominadores se acham acima de outro grupo e usam isso para confiná-los e matá-los à revelia. É tão... atual... Enfim, um filme de dinâmica da empatia forçada, expõe a podridão humana. Este filme traz uma discussão pouco falada até hoje na astrobiologia: E se um dia encontrarmos uma raça que possamos subjulgar? É um tema que abre o leque para o pior de nós. O final do filme deixa a esperança em aberto, mas toda a história é tão redonda e faz tanta questão de perturbar nosso senso sobre o que nos torna bom ou mau, que não preciso saber como será essa hipotética continuação. É um filme que te faz sentir ódio por fazer parte da raça que faz. Se você se sentiu assim, parabéns. O Troféu Misantropo chegará na sua casa muito em breve. 

MATRIX RELOADED - 2003

Até hoje acho este filme muito subvalorizado, apesar de ter algumas críticas a ele. Porém, o que quero focar aqui é como ele, assistido com a devida atenção, "estraga" qualquer visão otimista dos filmes subsequentes e dos humanos da franquia. Aqui, a misantropia é causada ao espectador e não aos personagens em si. Falo, mais especificamente, da cena entre Neo e o Arquiteto. Notem: Todo o conceito das Matrix que funcionavam só se davam assim porque os humanos tinham uma escolha entre estar dentro ou fora dela. Assim, a Anomalia, que antes era um problema se tornava parte da solução. O Arquiteto informou a Neo o suficiente apenas para que ele escolhesse. Zion destruída ou não pouco faria de diferença para as máquinas, que como ele mesmo disse, estavam prontas para abrir mão de algumas regalias para sobreviver. No caso, os humanos. O ponto aqui é: Tendo o fato de que Neo tomou uma decisão, ainda que diferenciada das suas demais versões anteriores, tanto ele quanto os outros humanos ainda são parte de um projeto de muitas variáveis? Independente de qualquer visão crítica à Revolutions ou Ressurrections, é importantíssimo dizer que no fim as máquinas ganham apenas por estarem vivas. Mesmo ao final do 4º filme, onde há uma direção diferenciada, que caminhe para uma convivência mutuamente parasital, dá a sensação de que o ser humano sobra na franquia, se tratando muito mais sobre ser massa de manobra dentro de um sistema e o que as máquinas estão dispostas a fazer pela própria vida. E talvez o ponto mais importante aqui é: Por que insistimos em sermos senhores de tudo e lutarmos tanto contra a maré? Matriz é, também, sobre a soberba humana em dizimar, se necessário (como foi muito apontado em Animatrix) para sobreviver. 
O diálogo entre Neo e o Arquiteto pode ser lido AQUI.

I.A. INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL - 2001

De todos, considero este o de final mais triste e é o que me arranca lágrimas até hoje. David, o robô interpretado por Haley Joel Osment, sofre tudo o que sofre pelas mãos humanas, vê seus iguais serem caçados, torturados e destruídos. É renegado por cada pessoa que encontra, é abandonado e busca sozinho, seu lugar no mundo. A misantropia, mais uma vez, é causada no espectador. David é um personagem esperançoso, de sorriso fácil, que passa por cada maldade e ainda luta pelo que acredita, negando, inclusive, sua programação básica, que é ser filho. O nível de dor causado a este personagem, mostra como seres humanos, incluindo sua busca ao lucro incessante, destrói e corrói. David, tão especial, não é único, nem... especial. Ele é  apenas importante para si mesmo e para seu ursinho. Todo o resto do mundo o despreza. Sua felicidade está no fim, feita apenas pelas máquinas, com sua mãe clonada. Ela morre dormindo, David, então se desliga ao seu lado. A alegria que poderia ter durado uma vida e negada pelos humanos ao personagem, foi condensada toda em um dia. Este é um final feliz? A ideia original de Kubrick era esta e Spielberg levou a cabo. A ideia é nos emocionar, mas ao custo da maldade humana. Ao resto, por causa do nosso ódio, cabe apenas um momento de alegria. Ah, porra, vocês não se emocionam lembrando daquele final? Eu dei uma bela marejada aqui. 

Isto posto, claro que há outros filmes, mas vou deixar para vocês darem suas ideias nos comentários. 
Espero que tenham gostado.
Abraços e até a próxima. 
Saitama

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